Dignidade, democracia e patriotismo

09-03-2013 13:35

“A mãe de todas as mensagens das manifestações do passado fim de semana foi a afirmação da vida contra a morte. Uma afirmação com três nomes: dignidade, democracia e patriotismo. E uma canção onde coube todo o País exceto o Governo. Sentindo um perigo e uma ameaça viscerais, os portugueses recusam-se a deixar de gostar de si e do seu País. Vivem um momento de intensa inteligência intuitiva, que está além e aquém do que os discursos e representações oficiais dizem deles. Recusam-se a aceitar que uma vida honesta feita de muito trabalho e estudo possa ser apelidada de preguiçosa, leviana e aventureira, que os impostos e os descontos pagos ao longo da vida tenham sido em vão, que quem menos pagou seja quem é é mais protegido num momento de dificuldade coletiva. Recusam-se a aceitar que a democracia seja uma máquina de triturar a esperança, um moinho que só sabe moer o moleiro, uma farsa onde só são reais os fios que sustentam as marionetes, uma engrenagem encalhada num Parlamento à beira-mar enterrado. Recusam-se a aceitar que os representantes eleitos pelo povo representem exclusivamente os interesses dos credores predadores, que os governantes tenham outra pátria que não a dos governados, que a riqueza do País e o bem-estar dos cidadãos se transformem em penhora de um futuro hipotecado, que o roubo deixe de o ser apenas por estar institucionalizado e cotado, internacionalmente. Recusam-se a aceitar que um governo nacional se comporte como a comissão liquidatária do País, reduza a história e a cultura a números, de que aliás retira tantas previsões quantas imprevisões. Viaje às escondidas pelo País e só fale em público quando o público é estrangeiro.” (VISÃO, 7 de março de 2013, p. 18, “A Vida Acima da Dívida”, Boaventura de Sousa Santos)