A 'declaração de guerra' do Estado à Igreja

06-05-2011 10:35

 

            "Há cem anos era aprovada a legislação que visava mudar, no 'espaço de duas gerações', as mentalidades dos portugueses no seu relacionamento com o catolicismo. Após alguns anos de atmosfera de guerra civil entre o Estado republicano e a Igreja, o clima de tensão foi, de forma gradual, substituído pela convivência e harmonia, com uma tranquila e negociada separação."

            "A Lei da Separação das Igrejas do Estado - designação oficial da lei de 20 de Abril de 1911 - apresentava-se como imparcial face a todos os cultos, mas acabaria por se transformar numa das principais armas do regime no combate aos católicos." (Jornal Diário de Notícias, 30 Abril 2011, pp. 28, 29; Abel Coelho de Morais)

 

            Como evangélicos consideramos que a separação da Igreja do Estado é a relação que melhor se ajusta ao ensino bíblico no Novo Testamento, no qual a Igreja surge e o que está em sintonia com o ensino de Jesus Cristo que declarou que a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, bem como que o Seu reino não é deste mundo.

            Isto não significa nem implica que Igreja e Estado tenham que viver de costas voltadas ou, pior ainda, numa postura de conflituosidade. Uma coisa é a separação da Igreja do Estado essencial à liberdade e igualdade religiosa, e outra bem diferente é o anticlericalismo ou o laicismo exacerbado jacobino.

            Existem múltiplos aspectos em que a sociedade tem tudo a beneficiar na cooperação e no respeito mútuo.

            No entanto parece-me a mim pessoalmente que sempre que as igrejas locais ou instituições de solidariedade promovidas pelas igrejas locais, se deixam aprisionar pela subsidio dependência, o Estado acaba por, de uma forma gradual, interferir e restringir os objectivos e a essência da acção promovida por elas.

            Pessoalmente identifico na história geral e na história portuguesa em particular, um ciclo vicioso em que as comunidades se deixam aprisionar e que passa numa primeira fase por viverem autonomamente em relação ao Estado e a desenvolverem biblicamente a sua acção social dentro das suas capacidades financeiras, muitas vezes sacrificiais e sem grande notoriedade pública e mediática; uma segunda fase em que são atraídas e seduzidas pelos apoios que o Estado oferece e que gradativamente levam a que o centro de gravidade das decisões deixa de estar sob a jurisdição da comunidade para passar a estar sob a determinação dos poderes públicos; e, finalmente, a constatação do logro e o retorno ao primeiro estágio ou uma cada vez maior institucionalização da igreja local passando ela mesmo a ser nominal, reprodutora do status quo e, no caso dos organismos, passarem a serem totalmente secularizados ao ponto de ninguém, ou de muito poucos, se lembrarem das suas origens e da fonte da sua inspiração. Outras vezes surgem movimentos renovados que voltam aos princípios neotestamentários em que pontua a ausência de burocracia, de legalismo, de complexidade estrutural e administrativa, e em que sobressai a simplicidade, a sobriedade, a espontaneidade e a iniciativa local.

            Toda a atenção é pouca. Sempre que os princípios e a essência começam a ficar comprometidos, ou a responsabilidade da contribuição deixa de estar sob os ombros e a missão dos membros da comunidade e passa a ser reivindicada dos poderes públicos, o desastre é eminente.

 

            "Ora bem, dêem a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus." (Mateus 22:21 - tradução "O Livro")

            "Não sou um rei terreno. Se o fosse, os meus seguidores teriam lutado quando os judeus me prenderam. Mas o meu reino não é deste mundo." (Palavras de Jesus a Pilatos registadas em João 18:36, tradução "O Livro")

 

 

SRP